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DIA DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA: CONHEÇA A IMPORTÂNCIA DA CARTA MAGNA

Publicado em: 24 de março de 2023

O Dia da Constituição é comemorado em 25 de março, data da primeira Carta Constitucional do Brasil, que foi outorgada em 1824 pelo imperador Dom Pedro I. Desde então, o país teve mais seis Constituições, que representaram importantes mudanças nas estruturas políticas e institucionais brasileiras.

Uma Constituição nacional é a lei máxima e fundamenta as regras de uma sociedade organizada. Seu conteúdo pode ser elaborado e exposto de formas muito distintas e isso implica no modelo social que será vivenciado pela população de determinado país.  Nossa atual Constituição, por exemplo, foi escrita e aprovada pela Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988) após um longo período ditatorial, e só pode ser alterada por meio de Emendas Constitucionais.

Para Diego Werneck, professor do Insper, a Constituição é um marco no qual a sociedade se reúne e cria regras para o bom convívio social. “Em um país no qual as pessoas têm visões muito distintas do que é o bem comum, é importante encontrar um terreno para que essas divergências sejam possíveis, dentro das regras e civilizadamente. A constituição é esse tipo de marco, com as pessoas criando regras, que nem sempre são perfeitas, mas que são importantes seguir para que a divergência seja controlada e civilizada.”

Confira nossa entrevista completa com Diego Werneck em comemoração ao Dia da Constituição:

No dia 25 de março, é celebrado o Dia da Constituição Brasileira, em homenagem à data de promulgação da nossa primeira Constituição. Qual a importância deste instrumento jurídico no Brasil?

Essa data comemora a promulgação da Constituição Imperial, o que é estranho, já que esse texto não possui diversas características que nós associaríamos a uma boa Constituição hoje. Ela era muito restritiva em termos de direitos, convivia com a escravidão, restringia o direito ao voto e trazia a previsão do Poder Moderador.

Ela foi importante por ser um marco da independência do Brasil e da soberania nacional, algo muito associado às Constituições, nas quais uma comunidade afirma suas próprias regras e sua autonomia. Ela também organizou o poder e criou as estruturas para o funcionamento do estado na época.

Acho que esse é um dia para pensarmos, não no texto de 1824, mas que há três décadas a população brasileira se organizou, com todas as dificuldades do período, para chegar em acordos e elaborar um texto que nos una enquanto nação. Ele não vai necessariamente agradar a todos, o que reforça a importância da negociação e do acordo para o jogo democrático.

De lá para cá, existiram outras sete Constituições. Quais principais transformações podem ser vistas no texto atual, promulgado em 1988?

A Constituição de 1824, na melhor das hipóteses, tolerava a escravidão e, na pior, consagrava esse regime de trabalho. Até hoje lidamos com esse legado. A inclusão do crime de racismo na nossa Constituição foi uma escolha ousada, que não é comum em outros lugares do mundo, mas que é muito significativa do arco de aprendizado e debate que liga esses dois textos.

Além disso, é uma Constituição que exige ação proativa do estado para resolver questões relacionadas à desigualdade material e à ausência de condições de vida digna para as pessoas. A partir do dia no qual ela é promulgada, ela já entra em contrariedade com muitas coisas que estão acontecendo, ou seja, ela pretende ser transformadora da realidade.

Há também uma evolução do sufrágio, o direito de voto, da forma mais ampla possível, com a inclusão de analfabetos, e também consagra um sistema de organização de estado com um grau de descentralização bem maior do que havia em Constituições anteriores. Ela reflete um aprendizado muito grande do país, na relação entre os poderes e suas competências.

Pensando na nossa Constituição atual, a questão da soberania nacional já não era uma necessidade tão forte, pois a mensagem de que o Brasil é um estado soberano já foi fixada ao longo dos anos. Por outro lado, ela representou o momento da retomada da soberania popular, com a elaboração do texto pela própria população através de seus representantes eleitos, o que foi uma conquista muito importante.

Como você vê a influência da Constituição no direcionamento dos rumos das instituições brasileiras?

Por um lado, vemos alguns indicadores de sucesso da Constituição de 1988 em moldar a política brasileira, como, por exemplo, o fato de que não houve nenhuma ruptura democrática a partir dela. O procedimento de impeachment foi usado duas vezes, sem que isso provocasse uma ruptura no mecanismo eleitoral, ainda que se critique os caminhos.

Ela se tornou, em um bom sentido, um mecanismo que foi apropriado pelos políticos. Isso é visível pela quantidade de emendas constitucionais, que mostra que os legisladores e governantes fazem um esforço para incluir coisas na Constituição, acrescentando novas políticas públicas e vendo o jogo constitucional como o único a ser jogado politicamente.

Agora, é natural que haja um momento de aprendizado, ou seja, de olhar para o texto de 1988 e se perguntar se não é necessário algum ajuste. Não existe um arranjo perfeito e, ao longo do tempo, vamos nos deparando com coisas que precisam ser alteradas. Mas esses diagnósticos não significam que há um esgotamento ou algum defeito insolúvel da Constituição. Nossa Constituição é muito resiliente.

Por mais que ela crie limites e controle a política, ela não substitui a ação do voto e dos atores políticos. Ela não é uma máquina que prescinde de políticos bons e pessoas capazes. Ela minimiza estragos, torna mais difícil a propagação de erros, força as autoridades a sentar e conversar, mas não substitui as boas políticas públicas. Precisamos separar as duas coisas, não dá pra imaginar que a Constituição nos torna à prova de governantes ruins.

Na sua visão, quais as principais ameaças ao bom funcionamento da Carta Magna?

Uma ameaça é a ideia de achar que só podemos acrescentar coisas a ela, e que nenhuma reforma profunda pode ser feita. É necessário ter uma capacidade de enxergar mudanças possíveis, ainda mais em um contexto de crise.

Por outro lado, a principal ameaça continua sendo a de não se levar a Constituição a sério, levantando questionamentos se realmente é tão importante cumprir o que está disposto ali. Tem partes da Constituição que vemos sendo violadas no dia a dia. Mas ela quer transformar essa realidade. Em alguma medida, é natural que ela não corresponda totalmente àquilo que está disposto, mas ela dá um critério para nós criticarmos a realidade e a melhorarmos.

Em um cenário de crise política e de saúde, como estamos vivendo agora na pandemia, é muito tentador pensar que se alguma mudança importante tem que ser feita, ela tem que ser viabilizada hoje. Mas, infelizmente, dentro do jogo constitucional, é preciso aceitar que nem sempre as melhores soluções vão ser admitidas pelas regras vigentes.

Uma outra ameaça hoje, que é um problema da política brasileira, é a polarização. Idealmente, as Constituições são conciliatórias, e a nossa, especificamente, é um texto que acomoda muitas opiniões, que aponta para muitas direções. No momento no qual as pessoas estão vendo as coisas de forma muito radical, essa virtude da Constituição passa a ser vida como um defeito.

 

Fonte: //www.insper.edu.br/

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